sábado, 7 de março de 2009

cartas


Hery:

Que noite fria, meu Amor, está em que te escrevo! A chuva cae em bátegas ininterruptas e um vento áspero, cortante, envolve todas as cousas no seu abraço glacial. A minha pelle está quase gelada e os meus dedos endurecidos pelo frio, quase se recusam a escrever.
E comtudo a minha alma sente calor, o sangue corre nas minhas veias com ardências satânicas; o desejo se enrosca no meu corpo como uma serpente de fogo... E tudo isso porque li a tua carta! E que carta louca, meu Amor! Foi-me impossível, lel-a sem corar; um rubor de pejo subiu-me às faces e instintivamente levei a mão ao decote do meu vestido como para defendel-o de ser aberto por ti. Affigurou-se-me, não estar lendo uma carta tua e sim ter-te junto de mim; crê, meu Hery, que experimentei a sensação de ter os teus cincos dedos a apertar-me a carne numa carícia violentamente sensual. O leve contacto da roupa irritou-me a pele, deu-me a impressão de ser o contacto da tua mão nervosa e febril que me percorresse o collo num affago voluptoso. Se estivesses aqui e me fizesses uma carta assim impregnada de volúpia ardentíssima, eu, quando a lesse, não me atreveria a olhar-te. Imagina agora se essas cousas todas que me escreves se chegarem a realizar, como eu não terei vergonha de ti! Se nas minhas eu tenho usado de uma linguagem demasiadamente franca, (não quero dizer livre), é porque, quando te escrevo, deixo o pensamento seguir os impulsos da minha natureza sensual e vibrátil; é porque sei que o amor sincero é confiante e perdoa essas loucuras do coração e dos sentidos.
Eu e tu, moços, ardentes e apaixonados, por que havemos de negar que nos amamos, que nos queremos, que nos desejamos?
Ah! Meu amor, tudo o que eu sinto por ti, eu não sei esconder-te; prefiro dizer-te, ainda que me censures, às vezes, as sós comtigo.
Mas eu te amo tanto e vivo tão longe de ti! Que cousa triste e desesperadora, meu Hery!...
Por hoje, digo-te adeus e também que estou nervosa, febril...
Para que me escreveste aquellas palavras?
A minha bocca te beija.


Anayde.



Parahyba, 27 de Julho de 1926.

.Dinda, muito obrigada por compartilhar sua experiência ;]

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